terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Universo Paralelo

Tudo pronto. Nossas roupas. Meus carrinhos.

No ônibus. Indo pegar o trem em Kaiseraugst, pro aeroporto de Zurich.


Depois de um ano e dois meses, tudo de novo. Só que agora ao contrário. Sai de casa, entra no ônibus. Sai do ônibus, entra no trem. Sai do trem, entra no outro trem. Sai do outro trem, entra no aeroporto. Entra no metrô. Sai do metrô, entra no avião. Sai do avião, chegou. Que calor.

- Mamãe, todo mundo fala português aqui.

Malas cheias. Carrinho pesado. Pessoas queridas esperando do lado de fora. Saída. Um monte de beijos. E abraços. Por que todo mundo me aperta? Por que é tão bom apertar as pessoas queridas? Pra onde a gente vai? Pra casa. Qual?  Como? Com quem?

Que confusão. Quanta gente. Quanto carro. Por que tem tanto carro? Por que os carros não andam? Acho que é porque tem muito carro. E as bicicletas? Cadê? Cadê a rua de bicicleta? Aqui ninguém usa patinete e nem patins. Porque tem muito carro. Mas tem muita moto também. E elas andam no meio dos carros. Porque tem muito carro. Meu pai tem uma moto, que fica na casa do tio Bêto.

Chegamos em São Paulo numa segunda-feira, dia 19 de novembro. No meio do feriado do dia 20 de novembro. Era pra ir rápido do aeroporto pra casa. Mas não foi. Porque tinha muito carro naquela rua do lado daquele rio fedorento. Será que alguém nada nesse rio? Acho que não. Mas o Voinho disse que um dia já nadou ali. Mas isso foi há muito, muito tempo. Depois jogaram um monte de sujeira no rio e ninguém nunca mais nadou lá. Que pena. Se esse rio fosse limpo que nem o rio Reno, que passa em Basel, e onde todo mundo nada no verão...
A cara de São Paulo

Não poderia ter lugar melhor pra encontrar com todo mundo do que na padaria que a gente sempre ía. E tava todo mundo lá esperando a gente. Foi só o Zé, o chapeiro, ver a gente chegando que foi logo distribuindo pão de queijo, pão na chapa, bisnaga, café com leite, suco de laranja. Tudo que a gente tinha antes de ir pra Suíça e que não tem mais. A padaria na Suíça vende pão. E a queijaria vende queijo. E o açougue vende carne. No Brasil, todo lugar vende de tudo.

Da padaria fomos direto pra casa da Dinda, onde seria nossa casa nos próximos 14 dias. O que nós mais fizemos nesses dias foi ver gente. Quanta gente. Chegou uma hora que eu nem sabia direito pra onde eu iria. Sai com a Vovó Rosali de manhã. Vai pra casa da Titia Laizinha de tarde. Volta pra casa da Dinda de noite. Acorda. Vai pra padaria. Pra casa da Dinda. Pro clube. Pra casa da Voinha. Pra pracinha brincar com a Julinha.

Um dia fomos levar a Julinha na escola. Não tínhamos carro. Fomos com o Jipe do Tio Edison. Jipe é um carro alto, sem capota, que sacode muito. Minha mãe bateu a cabeça no Santo Antonio do Jipe, de tanto que ele pulou. Quando chegamos na escola da Julinha, alguma coisa aconteceu. Eu olhei para aquele lugar : Pitanga Porã. O Manuel veio levar a Julia pra dentro da escola. Peraí, eu conheço o Manuel ! Eu conheço esse lugar ! É a minha escola ! Quer dizer, não é mais, mas vai ser sempre. O Manuel me convidou pra entrar. Meus amigos mudaram de classe. Porque cresceram. Eu também cresci. Tenho um metro e três e meio. O Artur. A Valentina. O Victor. A Manu Nardi. A Tia Ana. Estavam todos lá. Me olhando. Como se eu tivesse faltado uma semana e agora eu tinha voltado. Eles me chamaram pelo meu nome. Eles ainda lembram de mim. E eu deles. Olhei pra minha mãe e não entendi por que ela tava chorando.

E a saga continua. Vai nadar com a Sussu e o Fabinho na casa da Titia Laizinha. Comer pastel na casa da Voinha. Tomar banho na Dinda. Acordar e... ir pro sítio do Vovô Funcia ! Que calor. Piscina. Esguicho. Brincar até acabar a pilha. E no dia seguinte começa tudo de novo. A Vovó Celina preparou um café da manhã reforçado. Mais piscina com meu pai. Jabuticaba no pé. Aprendi a subir na jabuticabeira. As jabuticabas mais doces são as mais altas. Depois, colher a salada na horta. E churrasco, de carne. Algo que ultimamente só fazíamos com costelinha de porco e salsicha. E sozinhos. No Brasil, churrasco é um evento.
O tempo passa leeento em Piracaia

Amendoins do sítio. Orgânicos. Bio. Enormes.
Não pode comer muito senão vira pedra na barriga.

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E Deus criou o mundo. Criou o suíço, e perguntou :
- O que você deseja?
- Montanhas.
E assim foi feito. E nasceram os Alpes.
- O que mais você quer?
- Vacas.
Puff ! Um monte de vacas apareceram.
E o suíço na mesma hora começou a ordenhar, puxou uma caneca da bolsa, e provou o leite.
Em seguida virou-se pra Deus e perguntou :
- Lieber Gott, o senhor deseja uma caneca do meu leite? Está realmente muito bom.
- Claro que sim !
E provou do leite da vaca suíça, e disse :
- Hmmm... realmente o leite daqui é muito saboroso. Você quer mais alguma coisa?
- Um franco e oitenta.

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No nosso penúltimo dia no Brasil, foi o aniversário da Voinha. Ela fez 75 anos. Todo mundo foi comer pizza. Como sempre. Na casa da Titia Laizinha : o Voinho, a Voinha, o Beto, a Luísa, o Pedro, a Cici, o Gui, a Sussu, o Matteo, a Vó Yô, o Titio Marcão, e nós três. E depois da pizza tem bolo de chocolate.  Como sempre. E depois do bolo de chocolate tem cafezinho. Como sempre. E depois do cafezinho tem mais chocolatinho. E mais conversa fiada. E piadas. E licores. E provocaçōes entre são paulinos e corintianos. Como sempre. Ainda bem que eu torço pro Basel.
Só faltou o Fabinho. Que tava em outro planeta.

O Voinho, o motivo principal da nossa ida pro Brasil, tá melhor. E continua melhorando. A luta dele contra o inimigo invisível continua. A cada dia. Mas ele é forte. Meu pai sempre diz isso. Ele tá ali, quietinho. Olhando tudo. Falando pouco. O necessário. Ouvindo mais do que nunca. Ele é forte.

Sábado. Dia 1 de dezembro de 2012. Último dia. Acorda. Correria. Vai com a Vovó Rosali e a Julinha no clube. Mamãe pro cabeleireiro. Papai fazendo coletas, entregas, e mais visitas de ultimíssima hora. Volta pra casa. Encontra com o Vovô Funcia e Vovó Celina na casa da Dinda. Vai pro outro clube almoçar feijoada (faz parte da estratégia de antes de entrar no avião). Volta pra casa da Dinda. Coloca as malas no carro. Entra no carro. Vai pro aeroporto. Sai do carro. Entra no aeroporto. Entra no avião. Sai do avião, chegou. Que frio !

Chegamos de volta no domingo. 2 de dezembro de 2012. Há exatamente um ano o Vovô Funcia e a Vovó Celina embarcavam pra Suíça. Há exatamente um ano a Bisa Tília virava uma estrelinha. E ela continua aqui. Toda noite. Bem em cima da nossa casinha. Da nossa casinha de Arisdorf.

Julinha, concentrada na milenar arte.
Dra.Aretha me pegou de jeito.
Mas eu não tinha nenhum bichinho no dente.

RVPP - Registros Visuais Para a Posteridade

Feijoada no clube. Eu que queria tirar a foto...

Domingo, 2 de dezembro de 2012. No trem, de Zurich pra Olten.

Wettervorhersage (previsão do tempo).
Animador? Eu vou esquiar na semana que vem !